Em sua melhor forma, Black Alien apresenta show visceral em Curitiba

Após seis anos, rapper volta à capital paranense para apresentação sold out na Ópera de Arame

Por: Anna Tuttoilmondo
Fotografia: Willian Jhonnes

Não é exatamente um segredo os problemas enfrentados pelo rapper carioca Black Alien. Sua conturbada trajetória musical, permeada pelos problemas com álcool e drogas, foram a força motriz por trás de muitas das suas músicas. Mas a catarse ocorreu com o ótimo Abaixo de zero: Hello Hell, de 2019.

Aclamado como um dos melhores álbuns nacionais do ano, e um marco para o rap nacional, Gustavo de Almeida Ribeiro pôde exorcisar demônios, refletir sobre a própria vida, o vício, a sobriedade, a sanidade mental e a sociedade em um álbum rico de rimas certeiras e batidas envolventes, estas, pelo conceituado beatmaker Papatinho, conhecido por seus diversos projetos musicais, e, especialmente, por integrar o ConeCrew Diretoria.

Após seis anos desde a sua última passagem pela capital paranense, e três anos desde o lançamento do Hello Hell, Black Alien nos brindou com um grande show lotado na Ópera de Arame, um dos cartões postais da cidade. Acompanhado do DJ Erick Jay e do intéprete de libras Fabiano Gold, pudemos conferir o retorno de um homem em evolução;

O show, marcado para às 21h da sexta-feira, 15, sofreu quase 1h de atraso que, posteriormente, foi explicado pelo próprio rapper – atraso este decorrente de problemas com a sua voz. Mas isso não incomodou o público que, à aquela altura, ainda estava chegando e ocupando seus lugares.

Abrindo com Área 51, o público logo deixou claro que foram longos os anos em que o rapper ficou fora. Cantando junto em uníssono, artista e fãs entraram em sincronia, seguindo com “Chuck Berry”, single lançado em 2020. Mas foi com “Vai baby” e “Carta para Amy” que o público foi à loucura. Se a primeira se popularizou pelo teor vagabundo romântico e refrão grudento, a segunda é a reflexão introspectiva em formato de carta para a cantora Amy Winehouse.

Já com os primeiros versos “Lá vai o maltrapilho bem-vestido, mulambo perfumado / Faz mais um furo no cinto, faz mais sentido /  Fluindo no instinto, magro e drogado”, Black Alien abre o coração sobre sua ida do paraíso do sucesso e popularidade ao inferno do vício e abandono. Sóbrio e focado na jornada, Gustavo sabe que esse caminho não é fácil e a jornada é longa, algo explicitado no refrão “Mostre-me um homem são e eu o curarei / You’re runnin’ and you’re runnin’ and you’re runnin’ away / Não posso correr de mim mesmo eu sei / Nunca mais é tempo demais / Baby, o tempo é rei”.

Voltando no tempo, Black Alien nos transporta para 2004, ano do lançamento do seu primeiro álbum solo Babylon by Gus: o ano do macaco, com as já clássicas Caminhos do Destino e Babylon by Gus e sua inconfundível introdução. Embora esse álbum seja um marco na carreira do rapper e tenha oficializado sua importância no hall do rap nacional, o show foi, sem sombra de dúvidas, focado em Abaixo de Zero, cuja turnê de promoção sofreu com o avanço da pandemia.

E este álbum faz jus a todos os elogios e prêmios recebidos. Com letras densas e profundas, o público que lotou a Ópera de Arame cantou a plenos pulmões Take Ten, Au Revoir e a icônica Aniversário de Sobriedade.

Em Jamais Serão vem a primeira e tímida manifestação política. Ao gritar “eles jamais” para a platéia, logo iniciou-se um coro de “fora Bolsonaro” que se espalhou por todo o espaço. Embora sem, necessariamente, fazer um discurso, Black Alien deixou claro que esta é uma manifestação legítima do povo. E o show segue.

O derradeiro final ficou com Que Nem o Meu Cachorro, também do Abaixo de Zero que, apesar da sua densidade, não é apenas um álbum melancólico. Vai além disso. Também é sobre retomar o controle do próprio destino e mostrar a sua força. Quando ninguém mais acredita em você, é hora de parar e mudar.

E nós somos a canção que vem da zona de conflito / Pois a zona de conflito é minha zona de conforto / E a estrada pro inferno se desce de ponto-morto / Então, parou com a zona

Como era de se esperar, houve um bis. Então, quando falamos “fim de show”, é claro que ainda não acabou. No entanto, o bis ficou por conta de Vai Baby. Embora a música já tenha mostrado o seu potencial de popularidade, achei que, para o bis, outras músicas seriam uma melhor opção, como Mister Niterói, do Babylon by Gus. Seria ótimo ouvir esse som ao vivo.

De qualquer forma, Black Alien entregou um grande show. É democrático para um público diverso, sejam os mais velhos que acompanham sua trajetória desde o Planet Hemp ou mais jovens fãs de rap, além da acessibilidade que há alguns anos o rapper faz questão de incluir em seu trabalho – e todos nós agradecemos.

E para quem achava que Black Alien perdeu o momento e ficou no passado, ele canta:

Se vem baseado no passado, só há um resultado / Cê vai se foder / Porque eu sou o agora

E o agora o saúda. Bom te ver ativo e com todo o pique, Guzzie!

 

SETLIST

1 – Área 51
2 – Chuck Berry
3 – Vai Baby
4 – Carta para Amy
5 – Caminhos do destino
6 – Babylon by Gus
7 – Sangue de free
8 – Take ten
9 – Au revoir
10 – Como eu te quero
11 – Aniversário de sobriedade
12 – Na segunda vinda
13 – Pique Peaky Blinders
14 – Jamais serão
15 – Como eu te quero

Bis

Vai baby

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