Bucovina: Entrevista com Jorge Augusto Coan

Por Willian Jhonnes

Bucovina
Bucovina

A banda romena Bucovina esteve pela primeira vez no Brasil para uma série de shows que incluíram as cidades de Curitiba, São Paulo e Recife. Mesclando o peso do Heavy Metal com temas celtas, Bogdan Luparu (guitarras/vocais), Florin “Crivăţ” Ţibu (guitarras/vocais), Jorge Augusto Coan (baixo) e Bogdan “Vifor” Mihu (bateria) trouxeram aos fãs brasileiros muita força e energia, com músicas sobre sua terra e suas histórias.

Após essa pequena turnê, batemos um papo com Jorge Augusto Coan, um paulistano de fala mansa e um português carregado com o sotaque do leste europeu. Confiram!

Artemis: Essa foi a primeira vez que o Bucovina se apresentou no Brasil. Quais eram as expectativas da banda em relação a essa “aventura brasileira”?

Jorge: Sim, as expectativas eram das mais diversas pois eu, como brasileiro e consciente da situação da cena do metal underground no Brasil, estava com dois pés atrás, apesar também saber que temos muitos novos fãs em terras tupiniquins. Sabíamos que seria o primeiro grande passo e, também, a primeira vez que uma banda romena pisaria no Brasil e na América do Sul de uma maneira geral, e desde o primeiro voo com destino a Curitiba, passaram muitas possibilidades pelas nossas cabeças, indo das mais positivas até as mais “cabulosas”. Coisas como “e se cancelarem os shows e ficarmos sem a grana?” (risos).

Artemis: Essa mini turnê incluiu as cidades de São Paulo, Curitiba e Recife, cidades bem diferentes entre si. Como foi tocar para públicos tão diversos dentro de um mesmo país?

Jorge A. Coan
Jorge A. Coan

Jorge: Esse foi o principal objetivo no qual eu pensei, pois 6 adultos crescidos e educados na transição entre o Comunismo (1989) e o Liberalismo (até hoje) romeno, partindo pela primeira vez em direção a um outro continente, o qual tem uma diversidade étnica-cultural e imensidade geográfica e geopolítica espantosas, seria uma experiência muito intensa e uma grande oportunidade de compartilhar culturas musicais até então conhecidas apenas na internet. Era, também, a oportunidade para divulgar o nosso trabalho de produção independente de selos. A receptividade e hospitalidade em todas regiões foram acolhedoras, “easy-going”, o que não faria sentido algum de não ser no cenário metal. Esses públicos tão diferentes, poderíamos colocar aqui apenas como “público”, pois em todos os shows o “feedback” foi forte e positivo.

Artemis: Falando em diferenças, você é um brasileiro em uma banda romena que compõe suas músicas na língua natal. Como você acabou se tornando membro da Bucovina e como foi o seu processo de adaptação?

Jorge: Eu tinha acabado de vir da cidade Vilnius, capital da Lituânia e me estabilizado na cidade de Iasi, aqui na Romênia, e conheci um norte-americano que compunha música folk com elementos experimentais em um festival de arte do qual fiz parte com a apresentação de uma performance vídeo-fotográfica. Ensaiávamos periodicamente no antigo estúdio da banda Bucovina e com o passar do tempo acabei por conhecer o Mishu, baterista. Sempre conversávamos após o meu ensaio, e isso era em meados de 2012. No dia do meu aniversário eu estava comemorando no meu pequeno bar quando o Mishu apareceu e me chamou. Ele me propôs um ensaio/teste, pois o baixista na época estava prestes a sair da banda. Nos encontramos na data marcada para o teste no estúdio e executamos algumas músicas para as quais eu tive um tempo curto para tirá-las e entender o contexto das letras. Parece que deu certo.
Em termos da adaptação, é claro que este é um processo longo e demanda paciência, persistência e muito suor, pois estamos falando de contextos históricos, idiomas, semânticas e abordagens nas quais eu praticamente tive que renascer para “entender” e ainda continuo em um processo de assimilação todos os dias.

Artemis: Você está na banda desde 2013 ocupando o lugar que já foi de outro brasileiro – Paolo Cito Caminha -, que gravou o primeiro álbum da banda. Como você avalia essa experiência e como isso tem contribuído no processo criativo da banda?

Jorge: Todos os membros da Bucovina, quando nos deparamos com o fato de que sou o segundo brasileiro que cobre as linhas de baixo da banda, ficamos perplexos! Uma coincidência como essa é algo realmente difícil, considerando a distância entre os países, a escolha pela Romênia (se é que teve alguma), a mesma abordagem musical, mesmos amigos e adaptações rápidas. Com tudo isso, fica meio complicado de descrever em termos racionais, isso demandaria horas (risos).

Artemis: O álbum Nestramutat tem alcançado um grande reconhecimento do público aqui no Brasil. Como o público brasileiro recebeu a banda e como vocês se sentiram ao ver esse reconhecimento aqui?

Jorge: Em termos de público foi uma experiência positiva e também estranha. Havia pessoas cantando versos das músicas e estou falando de três lugares totalmente diferentes: Sul, Sudeste e Nordeste. Claro que o reconhecimento do trabalho de qualquer artista, e principalmente daqueles que estão a 14.000km de distância, é recebido com orgulho (não vaidade).

Artemis: Mestecanis, de 2010, continua sendo a música mais famosa da banda. Conte-nos um pouco da história por trás dessa música.

Jorge: Mestecanis é uma região montanhosa e repleta de coníferas (the land of the beech trees), bem gelada e úmida, pertencente à região da qual a banda Bucovina emprestou o seu nome. A música transmite uma “caminhada” entre as paisagens da Bucovina (região) que há muito vem sendo esquecida por conta de influências políticas modernas. Localizada no Estado (Judetul) Suceava, a banda faz uma alusão artística na qual tem certa proveniência histórica, porém o que se pauta na música fica mais atado às relações estéticas.

Artemis: Você participou da gravação de dois álbuns (Sub Stele e Nestramutat). Esses dois álbuns mostram uma evolução nas composições quando comparadas ao EP Duh, por exemplo. Coincidência ou há uma influência sua nas composições?

Jorge: Não diria evolução, mas que a banda não tem uma postura rígida em relação à questão de manter o estilo ou uma abordagem musical única. Somos experimentalistas no sentido de que não nos atemos apenas àquilo que se enquadra como metal. Ao que você se refere sobre as diferenças está mais ligado à produção do álbum e à produção musical em si. Isso tem mais a ver com a qualidade do trabalho. Trabalhamos desde o álbum Sub Stele com o Dan Swanö e por este motivo, do início das gravações até e o fim da mixagem, ele nos guia sobre como gravar. Existe uma mescla diferenciada em qualquer banda quando a troca de músicos acontece – uma nuance se modifica -, mas não diria que no caso da Bucovina foi modificada a “estrutura estética”, apesar da evidência do que se difere de um álbum para o outro.

Artemis: Os lançamentos da banda são ligeiramente espaçados, com uma média de três anos entre eles. Isso é uma questão criativa ou a banda se mantém ocupada com outras agendas?

Jorge: Depende muito das relações internas de uma banda. No nosso caso, se caracterizam os fatores: trabalho (todos trabalhamos em diferentes ramos), turnês (tempo na estrada), dinheiro (pois somos independentes e precisamos fazer o nosso) e o quanto estamos “livres” para nos encontrarmos para composições. A questão criativa é bastante viva e produtiva. No próximo ano (2017), lançaremos mais um álbum e para os anos que virão a meta é, ao menos, um álbum por ano.

Artemis: A banda tem planos de voltar ao Brasil no futuro?

Jorge: Em 2018 teremos uma turnê pela América do Sul e, claro, isso inclui o Brasil.

Artemis: A banda gostaria de deixar uma mensagem para os fãs aqui do Brasil?

Jorge: Foi uma experiência única e incrível! Apesar das complicações que estamos passando politicamente, vocês foram demais!

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